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Entre Getsêmani e o Gólgota: a Caveira, a Fé e a Urgência de um Cristianismo Adulto

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Exórdio - Getsêmani: O Jardim da Angústia Quando refletimos sobre a palavra Getsêmani , somos automaticamente transportados para um dos momentos mais cruciais da vida de Jesus: a sua agonia no jardim. Getsêmani era um jardim localizado no monte das Oliveiras, onde Jesus se retirou com seus discípulos para orar, horas antes de ser preso e condenado. Um espaço de oração, de luta espiritual, de profundo sofrimento emocional e psicológico, que se desdobraria nas cenas dramáticas da cruz. Mas o que torna Getsêmani tão relevante para a compreensão da fé cristã? Em um contexto de uma igreja cristã contemporânea, muitas vezes desinteressada pelas dores da fé, o nome Getsêmani tem se tornado mais uma palavra vazia, sem a profundidade que realmente deveria carregar. O que de fato representa esse "jardim da angústia" na Bíblia? O que ele nos diz sobre a natureza humana, sobre o sofrimento, a fé e a relação com Deus? Ao longo de diversas passagens bíblicas, o t...

Entre Judá e Cristo: Uma Análise Teológica da Expulsão do Jardim e suas Implicações para a Fé Cristã

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EXÓRDIO – Quando a teologia começa em casa: entre o espanto e o silêncio Foi em um momento corriqueiro, quase despretensioso, que uma série de questões fundamentais sobre a tradição bíblica vieram à tona. Meu filho, com apenas 12 anos, decidiu iniciar a leitura do livro de Gênesis por conta própria. Em poucos dias, vieram as perguntas — tão simples quanto devastadoras: “Pai, por que as águas estavam acima dos céus?” “Se é Deus quem fala, por que a Bíblia diz ‘façamos o homem’?” “Deus disse que se comessem do fruto morreriam, mas eles só foram expulsos... por quê?” “E por que Deus colocou querubins para guardar a árvore depois da expulsão, e não antes?” Essas questões, surgidas no ambiente mais íntimo e afetivo possível, não apenas apontam para uma curiosidade infantil legítima, mas também desvelam uma lacuna formativa no campo religioso e teológico. São perguntas fundadas não em ceticismo militante, mas em leitura atenta — e, ...

A Morte de Josias: Contradições Canônicas e Disputas Sacerdotais em Reis e Crônicas

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Exórdio: A confiabilidade da Bíblia à prova de Megido É comum, sobretudo nos ambientes religiosos de forte apelo retórico, a tentativa de sustentar a Bíblia como “o livro mais confiável do mundo” com base em slogans apologéticos e estatísticas de circulação editorial. Ainda hoje, em pleno avanço do secularismo acadêmico e da crítica histórica, multiplicam-se vídeos de pregadores que se gabam de enfrentar grupos de ateus “despreparados”, alardeando vitórias argumentativas sem qualquer compromisso com o rigor metodológico da teologia crítica ou da epistemologia laica. O problema emerge quando essa pretensa confiabilidade do texto bíblico é confrontada não com os céticos externos à tradição, mas com o próprio conteúdo interno das Escrituras — especificamente, com seus relatos múltiplos, tensionados e por vezes contraditórios. Um exemplo paradigmático é a narrativa da morte do rei Josias, registrada em dois livros...

O LABORATÓRIO DE TEOLOGIA: Uma Teologia Crítica na Fronteira das Ciências da Religião

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Introdução Em muitos círculos populares, a teologia ainda é percebida como uma espécie de “catequese de luxo” — um saber devocional, subjetivo e desprovido de critérios científicos. Tal visão, além de equivocada, ignora o fato de que a Teologia é reconhecida oficialmente pelo Ministério da Educação (MEC) como uma ciência pertencente ao campo das Ciências Humanas. Esse reconhecimento não apenas legitima sua presença acadêmica, mas também a submete às exigências de rigor metodológico que caracterizam qualquer empreendimento científico sério. Dizer que a teologia é ciência significa, antes de tudo, afirmar que ela não se ocupa de “Deus” como entidade metafísica acessível ao método empírico, mas sim dos discursos humanos que constroem, interpretam e reinterpretam essa figura nas mais diversas tradições culturais e religiosas. Em outras palavras, a teologia é o estudo sistemático e crítico do que a humanidade diz ser Deus (ou deus), com especial atenção às mediações te...

Leão XIV: Entre o Proletariado, o Neoplatonismo e a Inteligência Artificial – As Diretrizes de um Pontificado Inusitado

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O que esperar do pontificado de Leão XIV? O que esperar do pontificado de Leão XIV? A eleição de Leão XIV para o trono de Pedro já carrega, por si só, um conjunto instigante de sinais e contrastes que ajudam a projetar os contornos de um pontificado potencialmente decisivo para o futuro da Igreja em tempos de transformações tecnológicas, sociopolíticas e teológicas. A começar pelo nome: Leão XIV . O papa recém-eleito afirma que a escolha é uma homenagem direta a Leão XIII , pontífice do final do século XIX que buscou estabelecer um diálogo com a modernidade, sendo autor da encíclica Rerum Novarum , marco da Doutrina Social da Igreja. Ao evocar esse legado, Leão XIV sinaliza seu compromisso com uma Igreja que se debruça sobre a realidade do trabalho, da justiça social e da dignidade da pessoa humana — elementos fundamentais para qualquer reflexão teológica no século XXI. No entanto, sua origem também chama a atenção: estadunidense , com filiação ante...

Cristianismo Sem Mãe: Gnose, Encarnação e a Ausência de Maria na Fé Moderna

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EXÓRDIO – “Mulher, e não mãe?” Poucos personagens são tão reverenciados na tradição cristã quanto Maria de Nazaré. Venerada como a Theotokos (Mãe de Deus) desde o Concílio de Éfeso (431 d.C.), sua imagem consolidou-se como arquétipo da mãe abnegada, silenciosa, entregando seu filho à missão divina. É justamente por isso que um detalhe linguístico nos evangelhos chama tanto a atenção: Jesus jamais se refere a ela como “mãe” . Ao longo dos evangelhos canônicos, em momentos decisivos – como o milagre inaugural em Caná (Jo 2), o episódio no templo (Lc 2), o momento na cruz (Jo 19) e os encontros com seus familiares durante a pregação (Mt 12, Mc 3, Lc 8) – Jesus evita o uso do termo “mãe” , dirigindo-se a Maria com o título de “mulher” ou mesmo sem qualquer identificação afetiva explícita. Isso pode soar, à primeira vista, como frieza, distanciamento ou até desdém. Mas a ausência do vocativo “mãe” é um recurso teológico e simbólico muito mais profundo, cuja análise exige cuid...